domingo, 26 de maio de 2013

O dia D

Capítulo V

De manhã estava completamente de rastos. Começou a chegar a família e voltei a ficar com a adrenalina em altas. Estava a ser muito bom ter sempre alguém no hospital, mas a frustação foi-se apoderando-se de mim ao longo do dia. Queria usufruir da minha filha, queria ser mãe e não conseguia. Tinha dores fortes, nem virar-me de lado conseguia, quanto mais levantar-me, trocar uma fralda ou pegar nela. Este foi o sentimento que me deixou mais em baixo, ao longo de todo o tempo que estive no hospital. Ver as pessoas à minha volta a pegar-lhe, a tratar dela, a dar-lhe carinho e eu incapaz de o fazer pelas dores e pelas limitações físicas. Foi duro! No final da tarde estava ainda mais de rastos e assustada com a noite. Se durante o dia não consegui tratar da minha filha e o apoio da família tornou-se fundamental, como é que o ia fazer durante a noite, sozinha? Não me recordo como surgiu esta possibilidade, mas a enfermeira sugeriu que a bebecas passasse a noite no bercário para que eu pudesse descansar e ela estivesse bem acompanhada. Custou-me tanto, mas tanto tomar essa decisão, mas acedi em que ela passasse a noite longe de mim. Foi uma dor terrível e o festival hormonal não ajudou à festa. Então depois de tudo o que passei nos últimos nove meses, vejo a minha filha, mas não tenho capacidade para tratar dela, para ser mãe dela e à noite ainda a afasto de mim?! Psicologicamente isto é um abalo enorme. Pus em causa as minhas competências como mãe. Não é suposto estarmos sempre presentes para os nossos filhos, sermos as primeiras a tratar deles e a nutri-los. Achava que tinha de ir buscar uma força qualquer anormal, dentro de mim, que me permitisse tratar dela. Não aconteceu e estava a ter sérias dificuldades em lidar com isso. Por outro lado, racionalmente, sabia que tinha de o fazer, que era a decisão mais acertada, tinha de descansar e recuperar durante uma noite para ter capacidade para depois tratar dela.
Quando estava quase a fechar os olhos pedi às enfermeiras para a levarem. Já não aguentava nem mais um minuto. Assim que a levaram chorei. Chorei de tristeza e culpa. Tentei fechar os olhos e descansar. Não consegui. O sentimento era muito forte e a minha cabeça estava a andar às voltas. Forcei. Passou-se uma hora e meia e a minha cabeça não parava. Desesperei. Liguei ao T. Chorei mais um pouco. Libertei. Ele acalmou-me. Era o que precisava. Desliguei o telefone e adormeci.
No dia seguinte, eram 7h da manhã quando acordei. Liguei de imediato para o berçário e pedi para trazerem a bebecas. Sentia-me fresca e fofa! Devo ter dormido 6/7 horas, no máximo, mas era o que estava a precisar. Estava outra pessoa. Senti-me funcional e capaz de tratar dela. Senti que já conseguia ser a mãe que esperava e queria ser. Ela apareceu e senti-me a mãe mais feliz da vida. Da parte da manhã ninguém nos visitou e ainda bem. Precisava desse tempo com a bebecas. Tratei dela, namorámos, conhecemo-nos e enchi o meu coração. Isto é que é ser mãe. Só não estava preparada para que acontecesse mais de 24 horas após ela nascer.


3 comentários:

  1. Cata, vou-te dar um conselho e é de borla ;)

    UM - Porás em causa as tuas competências como mãe assim para aí um milhão de vezes na tua vida. Don't worry, és uma magnífica mãe a partir do segundo em que queres amar e cuidar da tua filha. Não há mais premissas necessárias.
    DOIS - Tu tens forças anormais dentro de ti que te permitirão cuidares dela. Mas essas forças só virão ao de cima quando for REALMENTE necessário. E garanto-te, tu saberás distinguir o "tenho de me ultrapassar a mim mesma e encontrar forças" do "tenho que me cansar até à exaustão só porque dizem que é assim que se é boa mãe". Sempre mas sempre que confiares em alguém, delega a tua filha. Ao pai dela (obviamente), à tua mãe, à tua irmã, à tua sogra, aos teus tios, sei lá. Mas aproveita todos os momentos para descansar, ir ao cabeleireiro, beber um café com o teu marido, dormir, passear o Allin, ir dar uma volta de carro.

    Vou-te contar uma coisa que durante anos me envergonhou imenso mas que hoje em dia já não. Tinha a MJ uns 2 meses ou 3, não sei, numa noite qualquer em que chorou, mas chorou, e chorou e tornou a chorar, eram umas 4 da manhã e eu desesperada de cansaço e sem saber o que fazer. O que quer este bebé horrível? pensava eu. A certa altura peguei-lhe pelos sovacos, levantei-a e abanei-a com brusquidão enquanto gritava "mas o que é que tu queresssss?". Horrível, não é? Agora percebo que a fiz incorrer num risco imenso daquilo a que se chama o shaken baby syndrome, uma coisa que pode ser bastante perigosa. Simplesmente porque meti na cabeça que tinha de ser eu a fazer tudo, tudo, tudo. Obviamente que estava tão exausta, tão triste porque nunca via ninguém, nunca saía com tempo só para mim, que descarreguei nela a minha raiva. Não cometi o mesmo erro com a Laura, deleguei-a ao pai sempre que pude e nunca a abanei :)

    Ora portanto, quero com isto dizer que podes, deves e tens de sentir-te bem contigo, de maneira a poderes sentir-te bem com a C.

    Kiss, kiss

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    1. Estou de acordo contigo. Neste momento 5 minutos longe dela custam-me horrores. No outro dia tive de ir ao registo e não quis levá-la porque ainda é muito pequena. Foram 2 horas e foi terrível! Sei que ela fica bem com uma série de pessoas, mas acho que nesta fase (ainda só tem 11 dias) ainda é demasiado cedo. Mas daqui a uns tempos concordo contigo. É tão importante ser a pessoa mais presente na vida da minha filha agora, como é igualmente importante daqui a uns tempos não me esquecer de mim própria como alguém que não é só mãe.
      Em relação à MJ não acho que agora agisses da mesma forma. Não só porque já passaste por isso, mas porque tinhas outra maturidade e apoio na altura.

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  2. Queres tu dizer que não tinha maturidade nenhuma, mazé! lololol

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